Foi como se eu tivesse matado um unicórnio (mágico), um panda (bebê) e uma ararinha azul (solta na natureza). Tudo junto e misturado.
E enquanto eu #vou_tecontar, você pode clicar nessa trilha sonora aqui, ó:
Pois bem. Eu estava quase no cruzamento da Faria Lima com a Cidade Jardim e o trânsito fluía mais livre que o normal. Porque o bicho tava pegando nas Marginais e ninguém conseguia chegar até lá, sabe como é?
Mais ou menos nessa hora passou uma coisa terrível pela minha cabeça:
Hoje cedo eu tirei o lixo. Quando desci pra garagem, desci com o lixo. Mas eu desconfio que troquei as bolas. Que coloquei o lixo orgânico no latão do reciclável e o reciclável no latão do orgânico.
Caramba, potinho de iogurte pode ser reaproveitado. Mas casca de gengibre não.
E enquanto eu cruzava a Cidade Jardim, pensava no que tinha no meu lixo. Na cara de surpresa do coletador quando encontrasse um frasco de Pantene Pro-V com as cascas de banana do vizinho.
Pensei na raiva que ele me dedicaria sem ao menos me conhecer, sem saber que, poxa (!), foi sem querer. E, claro, o funcionário do prédio não iria perceber porque o funcionário do prédio nunca percebe nada (!).
Cogitei ligar pro zelador, sei lá, avisar. Nessa hora o meu celular tocou.
Eu não costumo atender o celular enquanto estou no volante. Mas dei uma espiada e o número terminava com 000. Podia ser uma pauta.
Não era a minha mãe e eu preciso de uma pauta.
Então eu peguei o telefone, mas eu tava com a mão ocupada, me atrapalhei e, ao invés de atender, eu desliguei na cara da pessoa.
Eu troquei o lixo e ainda desliguei na cara da minha pauta.
E nessa hora eu estava mais ou menos no cruzamento com a Juscelino. E enquanto eu colocava o celular de volta no console passei por cima de uma bandeirinha do Brasil.
Sim, atropelei. Ela voou de algum carro e num só instante estava debaixo do meu pneu dianteiro. Eu até tentei desviar, como tento desviar de pombas que me aparecem do nada. Mas não deu.
E como se não bastasse trocar o lixo, desligar na cara da pauta e atropelar a bandeirinha do Brasil eu ainda assustei um pedestre gordinho.
O farol fechou, eu estava pensando no meu lixo, na cara do coletador, na minha pauta perdida (podia ser a Globo) e na bandeirinha atropelada que eu ainda via pelo retrovisor. O farol fechou e eu brequei de repente, com pé – e fé – no ABS.
Talvez eu tivesse passado direto se não visse o pé do executivo gordinho já na faixa. Porque frear de repente pode ser tão arriscado quanto cruzar o farol vermelho (né?).
Mas olhei no retrovisor e não tinha ninguém logo atrás. E tinha um gordinho na frente. E eu já tinha atropelado a bandeirinha do Brasil. Então brequei. Mas assustei o homem. Ele puxou o pé, depressa, de volta pra calçada, branco feito papel não reciclado. Me desculpei, sorri amarelo e ele passou.
Se ele soubesse que eu troquei o lixo, perdi uma pauta, atropelei minha nação, me perdoaria.
Né?
Mas eu não me perdoei. Soltei um palavrão grandão, com vontade. No mesmo instante em que o moço bonito no carro ao lado olhava pra mim.
*&%+˜#$@!!!!!!!
Pois é, eu falei um palavrão terrível pro moço bonito da Pajero ao lado. Isso depois de destruir o meio ambiente, desligar na cara da Globo, humilhar meu país e quase assassinar o presidente de uma multinacional.
O moço do carro ao lado riu.
Eu também.
Porque, sabe, não vou carregar toda essa culpa.
Já tenho tantas.
E de quem é a culpa?
Da alta do dólar. Não, da Dilma. Quer dizer, do Temer. Ou melhor, do caos no transporte público, na saúde e educação.
Não, pera…