Chega um dia que você cansa.
Cansa de tomar buzinada de maluco quando dá seta e reduz a velocidade pra entrar na garagem de casa. Cansa de tomar xingo de idiota porque seu prédio não tem recuo suficiente pra esperar o portão da garagem abrir sem atrapalhar a passagem. Cansa de botar o braço pra fora do carro, em vão, quando vê um apressadinho se aproximando a milhão.
E #vou_tecontar que nesse dia você surta.
E o meu relato selvagem – o surto pede essa trilha sonora aqui, ó:
https://www.youtube.com/watch?v=7MvsI8hbMfQ
Então, nesse dia, você sabe que não deve, mas perde a linha – da boa educação e do Equador.
Você para o carro no meio da rua, abaixa o vidro do carro, abraça a cangaceira que existe em você e despeja o latim de quinta categoria.
Como se fosse a sua última missão nessa rotina de sertão.
“C@&@/#&, eu reduzo a velocidade e dou seta, vc quer que eu solte fogos de artifício pra avisar que moro nessa $#&&@ de prédio e preciso entrar na m€#&@ da garagem que não tem uma £&$/@ de recuo? Precisa apertar a p#&&@ da sua buzina em cima de mim? Vai se *&€%!!!!! (assim, com vaaaaaárias exclamações)
E nesse dia há um silêncio.
Um homem – o malfeitor – te encara com os olhos arregalados. Visivelmente desconcertado, balbucia alguma coisa, pede desculpas, se justifica.
Em pensamento você logo se arrepende, imagina o risco de brigar na rua. E se ele tem uma arma? E que feio, que deselegante, que falta de equilíbrio, gente, essa não sou eu. Podia ter xingado uma vez só, baixinho.
Daí ele bota a cara pra fora da janela e diz que você é muito brava – com acento no MÚ.
Mas muito linda – com acento no LÍ.
E o sujeito te convida pra um café.
(!)
Esse dia foi hoje.
…
E ainda é terça.
Melhor eu trabalhar de taxi amanhã?
Foto: Hypescience.com