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Sobre persistência e a elegância de voar sozinho

Bem-te-vi - pitangus sulphuratus, pelas lentes do meu Tio-fotógrafo-passarinheiro Marco Guedes.
Bem-te-vi (pitangus sulphuratus), pelas lentes do Tio-fotógrafo-passarinheiro Marco Guedes.

 

Manhã de feriado, 21 de abril em SP, 8h50.
Bem-te-vi.

Um bem-te-vi perto da janela chamava. Ninguém respondia.
Tentou uma, duas, três. Nada.
Silêncio.
Insistiu. Uns 4 minutos.
Em vão, cantou na solidão.
Uma melodia que ninguém completou. Nem pássaro, nem gente.
Sabe como é: um fala, outro responde e alguém manda a frase completa? Então, #vou_tecontar que não teve.

Sua tentativa solitária foi enfraquecida por periquitos em algazarra. Aquela gritaria de comadres, sabe?
Uma falando em cima da outra, levantando a voz, ninguém parece se entender, mas depois fica tudo bem.
Alguém sabe se periquito tem ascendência italiana?

O fato é que a turminha – se bem me lembro, o coletivo de passarinho deve ser revoada ou passarada, mas vou chamar de turminha mesmo – , a turminha tinha pulmão.

Mas fiquei mesmo é pensando no bem-te-vi.
Falando sozinho numa manhã encalorada de feriado outonal.
Foi de uma persistência admirável.
Louvável.

E melancólica.

Logo sua fala foi duramente abafada pelo som de um motor histérico. Tipo uma Brasília velha na ladeira.
Mas se esse modelo de veículo automotivo te remeteu de alguma forma ao Planalto Central, por favor esquece. Pensa num fusca velho e tudo bem. Ou num cortador de grama.

O bem-te-vi enfim soube que era hora de desistir.
De seguir em frente e, com elegância, apostar num voo solo.
Esperto o bem-te-vi.
Mais esperto do que muita gente.

 


Foto: Bem-te-vi (pitangus sulphuratus), por Marco Guedes.