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Minha calcinha bege na gaveta de outra pessoa

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Foi estranho. Bem estranho. Ver uma foto do meu Instagram pessoal no Facebook de outra pessoa.

Sei que acontece todo dia, com tanta gente, com profissional e tal, mas aconteceu comigo, reles mortal.

Primeiro fez plim > opa, esse recorte de mundo é meu.
Procurei crédito, menção, referência, comentário. Nada. Nadica.

Achei feio. Entrei no Instagram da pessoa. E tava lá. A minha foto. Como se fosse dela. Com a minha legenda ruim e tudo. Compartilhada no Face e tudo.

Ei, ei, essa bobagem é minhaaa!!

#vou_tecontar que foi como encontrar a minha calcinha (bege) na gaveta de outra pessoa.
Sim, a bege. Básica. Cotidiana. Toda menina tem, mas cada uma tem a sua. A foto que muita gente já fez. Como um bolo de vó.

Não era eu na foto, claro. E a pessoa não é exatamente “amiga”, claro. Mas isso não é bacana, claro.

Né?

Parei pra pensar uns dez minutos.
Tentei isolar o signo solar. Sai, escorpião, a foto tá na rede, agora é do mundo. “Vamos dividir o bolo pra multiplicar”. “Nada se cria, tudo se copia”.

Lindo.

Mas não surrupiar. 

Né?

Bota lá as letras. Miúdas, que sejam. Uma @Fulana, tks. Aquele ícone de repost (que não sei como faz, acho que é um app). Ou então pega a receita, vai lá e faz o teu próprio bolo de vó. Clica por si mesma. Faz igual, se quiser. Será teu. O teu fubá. A tua imagem. Mas sem o sabor que só a vó pode dar. 

Sem a minha alma. 

Porque isso não dá pra imitar.

Na vida, na arte e na rede, é legal pra caramba ver uma coisa sua ser levada adiante pelas mãos de outras pessoas.

Contribuição, poxa! Reconhecimento!

E a gente faz isso de montão. Desde sempre. Mas que a fonte siga junto com a coisa. Criador e criatura. Mais do que propriedade intelectual, isso é essência. É o que dá sentido.

Ou, então, sei lá, entra num free images, usa uma foto de domínio público, dessas que não têm necessidade de citar a fonte. Sem crise, na honestidade.

A verdade é que enche o saco ver nosso whatever “roubartilhado” de um jeito ruim.

Mas é o tal negócio…

Se estamos aqui, estamos pra isso também. Damos a cara pra isso também.
Pra influenciar. Emaranhar. Provocar. Inspirar. Partilhar. Misturar. Confundir.
Pra “linkar”.
E, fatalmente, pra alguém te surrupiar.
É isso ou ficar mudo.
Sem mimimi.

Mas, pera, não é disso que eu tô falando.
Nem de direitos autorais na era digital. Nem da ABNT da citação da fonte. Nem da perda da aura. Nem vou chamar Susan Sontag. Nem tenho gabarito pra isso.

Tô só falando de mim.
De como foi encontrar a minha calcinha bege na gaveta de outra pessoa.
A minha foto, o meu olhar cotidiano, o meu ângulo da vida, o meu fragmento de realidade. Meu. Da minha biografia.
Mas foi pro no mundo. Agora é de outra pessoa.
E não porque ela também viu do mesmo ponto de vista. Mas porque ela gostaria de ter visto. E fez tudo errado.

Então deixo ela.

Só que da próxima vez, baby, dá o crédito. Cita a fonte. Dá um toque. Sinal de fumaça.  Uma arrobinha. É de bom tom. Faz sorrir. Vira homenagem. Soma. Canta pra subir.

Vaidade? Não. Caráter.

Porque não adianta subtrair.

Pro bem e pro mal.

O meu olhar.

Você nunca vai ter.

Ah, e experimenta só pegar uma foto melhor.

Uma calcinha colorida.  Pra você ver.

(assim diz o signo solar)

 


Foto: Peanuts na internet > itsburied | Tumblr. Já o ícone de repost é do iTunes (não sei se é domínio público, na dúvida eu cito). 😉

 

O primeiro anão a gente nunca esquece

Até então ela só conhecia a turma do Atchim e do Soneca. E aqueles de jardim.

E ‪#‎vou_tecontar‬ que foi numa loja de departamentos que ela viu desenho virar verdade (não, não tem delegacia na minha história, anão em delegacia é coisa de hoje em dia). 

Era Mesbla ou Mappin, não sei bem. A menina de uns 7 anos corria entre as araras. Mergulhava em tecidos, cores e texturas, enquanto a mãe escolhia algumas peças em tricô.

Era inverno em São Paulo e havia um mundo no meio daquele imenso guarda-roupa precificado. De cabide em cabide, a garotinha dançava (sim, tem anão e dança na minha história) e escolhia o figurino de sua estreia. Seria cantora, tipo a Madonna. Usaria preto, botas de couro e um casaco de pele.

Mas a canção era “Tuuuuudo Azuuuul, Adão e Evaaaa no Paraísooooooo…”. Porque a Madonna dela não cantava em inglês – ainda. E era inspirada no Pablo, de “Qual é a Música”.

E pra você entrar no clima, sugiro clicar nessa trilha aqui, olha:

https://www.youtube.com/watch?v=6xfgoACLkc4

Entre um Atchim e outro (não era anão, era ácaro), um flash do espetáculo. Agora só faltava a maquiagem. Um olho na mãe e outro no espelho e, nossa, que nariz vermelho. Não sabia inglês, mas já sabia o que é rinite. E que antialérgico dava Soneca.

Estava em bica, precisava assoar aquele nariz. Não podia entrar no palco daquele jeito, ranhenta. Só a mamãe poderia salvar o show.

Foi aí que aconteceu. Ela deu de cara com um anão. Um de verdade. A mãe ao lado e ela não desgrudava o olho daquela figura inédita. Não era o Atchim, não era de jardim. E num só instante, gritou pra mãe:

– Mãe, é um velho que não cresceu ou uma criança com cara de velho?

A mãe?

Fingiu que não conhecia aquela criança, que não era com ela, que nunca viu mais magra e mal educada. Até o anão ir embora.

Depois toca explicar pra criança que não se pode ser sincera sempre e que, de castigo, ela ia ficar sem comprar figurinha por uma semana. Figurinha era moeda corrente. Já o “politicamente correto” ainda não era moeda corrente no Brasil de 80.

Woody Allen com açúcar e sal

Esses dias fui ao cinema. Era Woody Allen <3, muita emoção.

#vou_tecontar que eu tava atrasada, o filme começando, aquela correria. Compra ingresso, pega água, pipoca média, um guardanapo, dois, coloca sal e… ops, era adoçante no envelope.

 

A-DO-ÇAN-TE.

 

Me doeu na consciência.

Porque errar com Woody Allen é pior que errar na final do Masterchef. Eu acho.

Ainda por cima derramei bem derramadinho, sabe assim, pra espalhar bem direitinho? Me fala quem foi que teve a ideia de colocar os envelopinhos de sal e adoçante lado a lado pra confundir a gente?

Ok, sem tempo pra lamúrias, peguei o sal de verdade, entrei na sala escura, cadê o meu lugar? Tinha gente. Pedi licença, sentei. Repirei.

Puxa, esqueci o óculos em casa. Mas tudo bem, eu consigo ver sem óculos, uso mais pra delinear os detalhes, as expressões, Woody Allen merece. Merece tudo. Merece pipoca, água mineral Evian (mas era Minalba, acho), óculos, casaco, até cobertor merece – mas isso eu não levei.

Ele só não merecia o meu erro. Merda, a pipoca ficou doce. Doce e salgada. Uma droga.

O filme andando e nada da pipoca se decidir. Peguei do meio, peguei da lateral, peguei do fundo… que droga de adoçante. Esse Linea tem mais presença do que qualquer sal Cisne que eu conheço. Até o piruá – a pipoca que não virou, ou seria a que se matou? – , tava indeciso.

Tá, eu ri.

Da pipoca, de mim mesma, do filme.

Ficou tudo assim-assim. A pipoca meio doce. A Emma Stone meio sem sal. A barriguinha do Phoenix com metade de açúcar e a outra metade de sal – bem adequado, aliás, pro papel. A professora Rita podia mais, tanto faz se açúcar ou sal, mas faltou. Já a filosofia toda ficou meio anêmica, tipo eu.

Decidi matar o saco de pipoca como um desafio até o fim do filme. E fiquei com sede. De mais. Diverti mas não surpreendi.

Só que é Woody Allen, então vale. Até com pipoca mais ou menos.

 

Qual era o nome do filme?

Acho que era A Lília Irracional.

Aquela que não consegue regular o açúcar e o sal.

 

Ops.


 

Ah, pega aqui o trailer do filme. Vale ver. Porque é Woody Allen <3.

 

Ela teve que me engolir

Tanta gente postando sobre o dia do irmão, então ‪#‎vou_tecontar‬ uma curta historinha.

Era uma vez uma família – pai, mãe grávida e filha de 4 anos e tanto. Todos esperavam um menino chegar.

Então nasceu uma pequena, esquisita e prematura escorpiana (nos anos 70 os exames pré-natal não eram assim uma Brastemp).

O pai saiu da maternidade, foi pra casa e disse pra mais velha:

– Filha, nasceu!! É uma menininha.

– Ah, não, pai! Devolve!! Você me prometeu um menino.

FIM.

.

Ela teve que me engolir.
💙

 

Agora fica com essa trilha aqui:

Criança com faniquito

Histeria no elevador logo cedo.

E eu com dor de cabeça.

Pra essa historinha que  #vou_tecontar, acho apropriado vc clicar nessa trilha aqui:

A menina, de uns 3 anos, não queria aquele sapato.

A mãe com voz estridente tentava explicar -leia-se “convencer”- que o sapato é bonito e combina com a roupa.

A menina berrava.

A mãe apelou:

– Filha, pergunta pra essa tia (apontando pra mim) se o sapato não está lindo. Não tá, Tia?

A menina me olhou desconfiada.

Fui sincera:

– O sapato é legal, mas só fica bonito em criança boazinha. Criança chiliquenta tem que ficar descalça. No berço. Sozinha. E no quarto escuro.

Funcionou. A criança ficou muda. A mãe também.


Nota: texto de 2014. Antes que me julgue: acho desnecessário obrigar criança a usar sapato. Por mim ia de havaianas. E, claro, também acho um saco criança que berra no elevador. Pronto. Pode julgar agora. Beijo.

Sobre como eu desisti do piano

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Outro dia, na manicure:

– Lília, você tem unhas lindas, parecem longas mesmo quando estão curtas. Ah, vamos só dar uma lixadinha, não corta, senão fica até dolorido embaixo. (…) #vou_tecontar, Lília, acho que mais metade desse salão gostaria de ter mãos como as suas.

O piano já vai entrar em cena, então sugiro colocar essa trilha sonora aqui, ó:

1989, nas aulas de piano:

– Lília, eu gosto muito de dar aulas pra você. É uma menina que sabe escutar e tem mãos de pianista, com dedos longos e finos. Só precisa praticar um pouco mais em casa, solfejar todos os dias… e cortar as unhas. Unhas compridas batem nas teclas, atrapalham o desempenho ao piano.

– Lília o que são essas bolhas na sua mão?
– Aula de tênis, professora, a raquete me faz bolhas.
– Nossa, Lília, precisa tomar mais cuidado, não vá machucar os dedos ou não conseguirá tocar piano, viu?

– Lília, o que há, você não está indo bem hoje?
– É que eu tô com dor na mão, professora, ontem foi campeonato de vôlei na escola…
– Lília, vôlei e piano não combinam, está bem? E você é muito pequena pra jogar vôlei.
– Mas eu jogo na rede…
– Você precisa cuidar das suas mãos para tocar piano. Protegê-las… e cortar as unhas, não se esqueça, viu? Vamos ficar mais na teoria hoje.

– Lília, muito bem, a aula hoje foi boa, você evoluiu bem na Sonata. Mas vou escrever aqui no seu caderno: não esqueça de cortar as unhas.
– Mas, professora, eu cortei ontem. Se cortar mais dói, fica vermelho, sai até sangue. Minha mãe disse que está bom assim.
– Lília, precisa ficar mais curtinha, unhas grandes não servem para o piano.

– Lília, o que aconteceu, você está machucada? Seu pulso está roxo…
– É que foi na aula de teatro, professora, eu torci. É assim mesmo, acontecia também na ginástica olímpica, só esse pé eu torci sete vezes.
– Lília, você tem uma estrutura muito delicada pra isso, precisa tomar cuidado. E lembre-se de cortar mais as unhas, querida, ainda estão muito grandes, viu?

Lília largou as aulas de piano.

Lília vendeu o piano.

Lília nunca mais tocou piano.

 


Foto: pt.cantorion.org

 

Cuba

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Há seis meses (e alguns dias) eu embarcava pra Cuba.

Tava lembrando aqui… eu queria tanto essa viagem, mas taaaaanto, que contei moedinhas e tirei $ até da nota fiscal paulista (bendito resgate).

Paguei coisa de R$ 2,68 no dólar e R$ 3,36 no euro, achando que era maluquice porque tava mto caro – tava.

De lá pra cá, vendo as notícias do dia… bem… mandei bem.

Sobre Cuba?

#vou_tecontar só uma coisa: Vá!!!

 


Foto: arquivo pessoal.

Barata voa. E apavora

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Noite quente em São Paulo. Janelas escancaradas e eu bonitinha respondendo e-mails.

Eis que… uma barata entra pela janela.

Feia e gigante. Apavorante.

#vou_tecontar que a invasora se instalou na parede lateral.

Susto.

Olhei pra ela e pensei rápido, muito rápido: cadê o telefone, vou chamar o zelador.

Mas o telefone estava longe de mim – perto dela. E eu, descalça, desarmada.

Ela bateu as asas barulhentas e veio com tudo na minha direção, em linha reta, na altura do meu rosto, num ataque frontal.

Gritei e pulei da cadeira – não necessariamente nessa ordem. Dois metros em um segundo. Não lembro da última vez que dei um berro assim, a plenos pulmões.

Me senti a louca do oitavo andar, mas só depois. Antes, peguei o veneno e descarreguei com vontade ma barata. Mesa, cadeira, chão, parede… perseguindo a agonia da intrusa mal educada até seu último mexer de antenas.

E o cadáver está lá, no cantinho.

Agora sim, me sinto a louca do oitavo andar.

Com medo da família da Dona Barata vir reivindicar o corpo.

 


A foto que ilustra o texto me foi enviada por pelo menos três amigas depois que eu contei essa história. Desconheço a fonte, mas agradeço a inspiração. 😉

 

Parecia um sonho bom

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O cenário era lindo. Europeu. E eu tinha na mão uma passagem aérea. Parecia um sonho bom.

Finalmente um sonho bom!

Mas #vou_tecontar que a passagem tava toda errada. Era de um voo que tinha saído 6 horas antes. E que faria em 14 horas um trecho de 2h30. Tinha uma travessia de barco, de jipe, só faltava conexão pra pegar jegue.

Frio na barriga.

Acordei, dormi de novo e a história continuou. Sabe assim?

Eu ligava pra Gol (era Europa mas era Gol, sonho permite esse tipo de incoerência, né?), mas não conseguia resolver, não conseguia trocar a passagem, não conseguia nada.

O próximo voo custava umas dez vezes mais. E a moça insistia que àquela altura eu tinha que estar no barco. Porque de acordo com o sistema eu tinha embarcado.

– Moça, eu juro que não tô no barco, moça. Não foi isso que eu comprei.

Ela não aceitava a realidade. E eu não aceitava aquele trajeto de maluco, uma viagem torta que começou antes mesmo da passagem chegar na minha mão.

Eu queria um próximo voo. Queria resolver aquilo. Queria seguir adiante.

Como terminou?

Com a moça da Gol me dizendo, com aquela voz de aeroporto, que eu teria que me entender comigo mesma. (!)

Porque, sim, eu estava naquela viagem que já tinha começado.

E se eu quisesse seguir um trajeto diferente seria problema meu e não da companhia aérea.

E eu não poderia arcar com um próximo voo.

Parecia um sonho bom.
Parecia.

 


Imagem: Wikipedia.org

 

Meu coração em câmera lenta

Manhã de quarta-feira, 26 de agosto de 2015. #vou_tecontar que a trilha de hoje tá aqui:

https://youtu.be/LS_AhzPVn-U

Senhora, esse exame aqui o seu convênio não cobre. Está bem, farei os outros. São 21, portanto. Só aguardar, vão chamar pelo nome. Obrigada. Senhora Maria Rebello. Eu? A senhora é Maria Rebello? Não. Sim. Quer dizer, sou. Documento e protocolo, por favor. Pode sentar. Sou eu, viu? Como se alguém quisesse tomar o meu lugar aqui. Jejum de 12 a 14 horas? Sim, 13. Confere o nome e data de nascimento nos tubinhos, por favor. Um, dois, três… nove. Ok. A tiazinha de óculos e cabelos brancos derrubou um negócio, se atrapalhou com a luva – a luva era azul, eu nunca tinha visto luva azul no laboratório, conferiu o papel, o tubinho, o papel de novo. São dez etiquetas e nove tubinhos, tem alguma coisa errada. Olhou, olhou de novo, olhou outra vez. Pensei em oferecer ajuda, mas ela pediu pra aguardar e foi lá dentro verificar. Respondi um e-mail. Ela voltou. Estava mesmo faltando um. Nossa, que bom que você viu. Legal, a tiazinha era atrapalhada, mas cuidadosa, ponto pra ela. Eu não ia querer voltar por causa de um tubinho, uma etiqueta, uma ferritina qualquer. Botou o apoio. Coloca o braço aqui. Virou o apoio. Assim é melhor. Colocou um elástico, apertou o elástico, tá bom assim? Deu batidinhas na veia. Tinha todo o tempo do mundo. Abre e fecha a mão. Assim. Agora deixa aberta. Colocou a outra luva, se atrapalhou com a luva azul, respirou, procurou alguma coisa. Pegou uma agulha, devolveu, pegou outra. Caramba, essa tia sabe mesmo o que tá fazendo? Agora uma picadinha. Leve, de leve. Legal, a tiazinha é confusa mas tem mão leve. As aparências enganam. Vai demorar um pouquinho, tá? Tá, né. Um tubinho, dois tubinhos. Que sangue lerdo. Troca o tubinho, afunda a agulhinha. Uma eternidade e ainda o quarto tubinho. Gente, nunca vi uma coleta tão devagar. Olhei pra porta, respirei. Quinto tubinho, esse era maior. A cada troca de tubinho uma pontadinha e logo perdi a conta. Silêncio. Escutei meus batimentos. Lentos. Vamos distrair que passa mais rápido, né? Pensei no trabalho esperando, no que teria pro almoço, na ligação perdida e, putz, esqueci de tirar o lixo. Esquentamento, ofegância, mas não por causa do lixo ou da geladeira vazia. Falta muito?, pensei. Falta muito?, perguntei. Não, falta só um depois desse, você está bem? Sim. Não. Quer dizer, pode acabar logo? Não tô me sentindo muito bem. Merda, só me faltava essa. Suadouro. Zonzeira. Frio, calor e a tia abre a porta. Chama o Mauro. A pressão dela caiu. Burburinho, luz que vai, luz que vem. Alguém aperta minha nuca. Levanta a cabeça dela. Pano molhado. Estica a perna. Os lábios estão brancos. Tiro o casaco. Você quer uma bolachinha? Você está sozinha? Oi, fala comigo. Não. Sim. Posso deitar um pouquinho? Pluft.
Alguém me carregou. Acordei deitada numa sala e vi uns flashes. O Mauro do lado, um copo d´água. Você está melhor? Sua pressão caiu, foi muito tempo em jejum e bastante sangue pra tirar. Sim, obrigada, desculpe, obrigada, quer dizer, lamento, poxa, obrigada, “isso nunca me aconteceu antes”, tá é mentira, mas não é rotina. Imagina, isso acontece, é normal, vc está um pouco fraca, pode ser anemia, mas vai passar, quer uma bolachinha salgada? Tem lasanha, Mauro? Brincadeira, obrigada, desculpe. Vou nessa, tchau.

E o que ficou foi um enjoo.

De laboratório.

#vou_tecontar, pra mim já deu.

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